No alto da montanha...

No alto da montanha...
Capilla del Monte - Cerro Uritorco - Argentina

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Um fim de semana vazio e cheio


Ao contrário do que se podia imaginar à primeira vista, esse fim de semana, que foi o meu primeiro, eu não fiz quase nada prático. Mas foram dois dias muito intensos, com muitas reflexões que preencheram grande parte do espaço livre que havia.

Sábado durante o dia conversei muito com amigos e familiares via internet. Grande parte do dia foi matando a saudade da galera. Devo aqui registrar, saindo da ordem cronológica, que muito me emocionou ao fim do dia ter recebido um e-mail da minha amada avó. A sensação me parecia a de ganhar um presente. Fiquei muito feliz por tê-lo recebido e muito contente com as palavras que me disse. Fiquei satisfeita porque ela me falou que estou me tornando uma coisa que eu gostaria muito de me tornar um dia. Assim, me deu ainda mais inspiração para investir no ideal! E também porque disse que estou cercada de anjos, e com suas doces palavras me sinto mais protegida e abençoada.

À noite fui à feira de artesanato com David e Melyssa que vai morar com a gente. Foi ótimo! A feira é linda, muito hippie e muito colorida. Em seu entorno existem muitos músicos de rua que tocam as músicas regionais e alegram o ambiente. Eles me deixaram fascinada pelo o que eu via e ouvia. Pessoas simples, com suas bagagens e bebês, vivendo ao mesmo tempo de forma suave e intensa. Ao lado da feira havia um bar, que no dia anterior eu já tinha passado por ele e me encantado, porque tocava reggae. Mas como eu estava com a turma que estava mais ligada em outro tipo de ambiente, eu deixei passar batido. Ah... mas nesse sábado!!! A feira estava muito inspiradora para se experimentar um bom ambiente. Não resisti e fiz o convite pros dois amigos irem para esse bar comigo. Nossa, que sorte a minha que toparam e que também se divertiram muito ali. Eles comeram um salgado muito tradicional aqui que se chama empanadas, que são como nossos pastéis assados. Só havia com carne. Não como carne, mas adorei, porque eu estava mesmo era de olho no salgado que se vendia na rua, em meio à feira. Pra mim feira é pra isso, pra se comer com o povo, para conversar com o povo! Assim, deixei os dois na mesa por uns minutos e fui comprar o salgado. Passei por alguns vendedores diferentes e todos foram muito simpáticos comigo, um não resistiu a piada de que na Copa a Argentina vence o Brasil! Curioso como não preciso falar que sou brasileira para todos saberem, óbvio! Meu portunhol dá na cara! E melhor ainda é que mesmo com a rivalidade do futebol todas as pessoas me tratam muito bem aqui. (Faço aqui um parênteses).

Essa é uma das coisas que fiquei pensando. Como as pessoas aqui são agradáveis! Não importa se são homens, mulheres, jovens, idosos. Não importa se não sei falar espanhol. Aonde vou as pessoas conversam comigo com muita simpatia. O dia que fui comprar meu incenso uma senhora de setenta anos, mais ou menos, conversou até comigo na loja. Eu dizia, “não consigo falar muito bem”, e ela respondia, “não importa, todos falamos um portunhol, não se preocupe com isso!” e fez questão de conversar bastante comigo. No mesmo dia fui a uma loja de cereais e mesma coisa ocorreu com a senhora que me atendia no balcão, pura simpatia! No sábado entrei em uma loja de artesanato, falei duas palavras, suficiente para os dois caras que estavam lá começarem a brincar com a “brasileira”. Todos muito sorridentes e divertidos. E é fácil sentir por aqui como as pessoas querem as outras bem! Esse moço mesmo da loja, eu contei para ele que queria vender artesanatos aqui e que queria uma noção dos preços, ele não se importou em me dizer. No dia seguinte voltei na loja para ver se ele vendia penas, ele não tinha e também não se incomodou em falar aonde encontro. Achei ótimo ele não ter o espírito tão comum de concorrência que vejo freqüentemente entre artesãos (por mais que isso pareça não acontecer, acontece mesmo). Ah, como estou contente aqui!

Bom, comprei meu salgado e sentei com meus amigos no bar. Tomamos uma bebida nova para mim e para Melyssa que é muito tradicional aqui, Fernet. Tem um gosto muito forte de ervas mate, e tem álcool e coca-cola ( que não gosto, mas nesse caso caiu bem). Pedimos um para nós três para vermos se era bom. Adorei, pedimos mais um e ficamos conversando por um bom tempo. Me encanta como meus amigos aqui tem toda paciência do mundo para me ouvir e me ensinar como devo falar as palavras e frases certas! Não tenho dúvidas que são pessoas muito boas. Creio que é como minha avó me falou, estou a todo tempo cercada de anjos que sempre colocam à frente pessoas boas no meu caminho.

E por falar nisso, no meu domingo também cruzou por mim mais boas energias personificadas. Conversei pela internet por um tempo com o Hare que conheci vendendo livro na rua. Foi breve, mas me deixou muito contente. Meus amigos americanos são mesmo pessoas excelentes, mas pensam e vivem uma vida um pouco diferente da minha. É um pouco complicado conversarmos sobre coisas mais pessoais (no sentido de interiorização), e é legal encontrar pessoas com quem me identifico. Em Belo Horizonte freqüentei o templo por um tempo, mas decidida a não me tornar uma devota. Sei que aqui não irei mudar de idéia, mas me sinto muito bem neste ambiente e na presença deste novo amigo, sinto uma grande força de luz e paz. Li algumas coisas que ele escreveu em sua página da internet e um texto não saiu da minha cabeça:

“Hace unos meses atrás, un día de verano. Fui al centro a la plaza San Martín, como siempre lo hago, a compartir mi filosofía de vida a través de los libros de India. Ese día hacia muchísimo pero muchísimo calor. En un momento trate de mostrar mis libros a una señora que iba pasando, y me dice en un tono muy alto y muy enojada: " no quiero nada, nooooo". Le pregunte el porque me gritaba de esa manera, y el porque estaba enojada? y me contesto muy enojada: " es que tengo calorrrr" y se fue. En ese mismo momento mire hacia la plaza, y pude ver a unos turistas sentados en uno de los bancos, con sus mochilas grandes de viaje, llenos de colores y alegría, tomando sol con unas sonrisas grandes, demostrando satisfacción y felicidad por el sol que les daba en sus rostros. Allí pude entender que el sol era el mismo, el calor era el mismo,la ciudad era la misma, la plaza era la misma. Pero una persona eligió sufrir por ello, y otros eligieron ser felices y disfrutar del mismo sol y calor. Tengo una frase que dice " La vida es lo que tu quieras que sea" No podemos comprar la felicidad. La felicidad es un sentimiento que tu eliges sentirlo en cualquier momento que desees sentirlo. Y en cuanta mas felicidad interna sintamos, esa felicidad podremos compartirla con todos en todo momento. 
Con amor Mathura !!!


Assim passei o domingo... refletindo sobre as coisas da vida, da minha vida. Pensei muito sobre minha viagem, sobre meus objetivos, sobre o que vivi nesses dias. Preferi não sair durante o dia. Achei engraçado. Meu primeiro fim de semana, eu poderia estar querendo fazer mil coisas, conhecer mil lugares, mas hum... O dia tinha começado muito chuvoso, e tudo o que eu queria era ficar em casa fazendo artesanato e pensando. Assim o fiz! Fiz dois filtros do sonho que gostei muito e enquanto isso pensei bastante. Somente às nove da noite tive vontade de sair. E para aonde? Para a feira de novo! Mas dessa vez quis sair só. E fui. Dei uma volta na feira e sentei em um bar para comer sanduíche e tomar suco de morango. Enquanto esperava o preparo, abri o livro que minhas amigas Déborah e Paula me presentearam. O livro se chama Presente do Mar (Anne Morrow Lindberh). Poderia ser um presente da Déborah, um presente da Paula, um presente do Mar, mas creio que foi um presente dos Deuses. As palavras que li enquanto esperava o meu lanche, eram exatamente a organização de tudo que pensei durante o dia. Foi a solidificação dos meus pensamentos, uma ajuda para eu entender o que havia refletido. Incrível! Li poucos capítulos por enquanto, mas já me sinto muito bem com a organização.

Um dia antes da minha viagem Paulinha havia me perguntando algo como, o que eu estava esperando, ou como eu imaginava que seria essa viagem. Eu disse a ela que... nada!! Faltava apenas um dia, mas eu não conseguia ter planos concretos e muito menos expectativas. Estava adorando isso! Talvez pela primeira vez estivesse realmente serena quanto às expectativas. Um pouco de medo é claro, mas nada que consumisse minha cabeça com imaginações tolas de como seria cada dia, o que eu ia fazer, o que eu ia encontrar, o que iria conhecer, para onde ia. Nãoooo!! Não quis perder tempo com isso. Na verdade o que muito me consumiu antes da viagem foi quando me senti obrigada a perder esse tempo, quando tive que planejar aonde iria morar e como gastaria o dinheiro aqui. Mas não queria ter que pensar nisso. A única coisa que eu queria, era IR! Falei algumas vezes sobre conhecer novas paisagens e novas culturas, mas talvez porque isso fosse óbvio demais. Vim mesmo vazia!

“Mas esses tesouros não devem ser procurados, muito menos desenterrados. Nada de escavar o fundo do mar. Isso frustraria nosso objetivo. O mar não recompensa os que são por demais ansiosos, ávidos ou impacientes. Escavar tesouros mostra não só impaciência e avidez, mas também falta de fé. Paciência, paciência, paciência é o que nos ensina o mar. Paciência e fé. Precisamos nos deitar vazios, abertos e sem exigências, como a praia – esperando um presente do mar. A concha que tenho em minhas mãos está vazia. Nela já morou um molusco muito semelhante ao caracol. Depois de sua morte, veio um pequeno caranguejo-eremita que a ocupou por algum tempo. Fugiu, deixando para trás seu rastro como uma delicada trepadeira na areia. Fugiu e me deixou sua concha que um dia já lhe serviu de proteção. Reviro a concha em minha mão, contemplando a porta aberta por onde saiu. Por que será que fugiu? Teria encontrado uma casa melhor, um jeito melhor de viver? Percebo então que também fugi, deixando a concha da minha vida por algumas semanas de férias. A concha em minha mão, no entanto, é simples e singela. E, além disso, é linda!” (Lindberh).

Durante meus dias aqui tenho pensado o quanto quero estar bem com meu interior. Quero me sentir feliz e leve, suave, sem que para tanto tenha que seguir normas, regras. Quero muito um encontro com minha espiritualidade, a busco em vários caminhos. Sou feliz quando encontro pistas destes caminhos, mas agora quero procurar em meu interior. Primeiro quero o encontro com o Deus que habita em mim, quero conversar com meu íntimo, depois acredito que terei mais clareza para saber a caminhada que quero levar. Não quero fazer o inverso. Não quero me prender a uma religião para depois andar no caminho. Quero iniciar a busca comigo, em mim. Sinto a proteção de muitos anjos em meu redor, sinto todos os dias às graças que Deus me dá. Não me restam dúvidas que recebo sempre muita luz. Como sou grata por isso! E quero um tempo para pensar nisso, para sentir com mais delicadeza à cada manifestação da existência do meu Deus.

“quero estar em paz comigo mesma. Quero uma simplicidade no olhar, uma pureza nas intenções e um núcleo central para a minha vida que me permitam realizar minhas obrigações e atividades da melhor forma possível. Tomando emprestado um termo da linguagem dos santos, quero viver em “estado de graça” tanto quanto possível. Não estou usando esse termo estritamente teológico. Para mim, estado de graça significa uma harmonia interior, essencial, espiritual, que se pode traduzir em harmonia exterior. Talvez esteja buscando o que Sócrates pediu na prece de Febro, quando disse: “...ajudai-me a buscar a beleza interior e fazei com que as coisas exteriores se harmonizem com a beleza espiritual (...). Há certos caminhos que podemos trilhar. Um deles é a simplicidade da vida”. (Lindberh).

Além de pensar em coisas suaves, por aqui também penso que terei que voltar para a vida normal. E me pergunto se há alguma forma de viver uma vida de graduada, em cidade urbana, capitalista, com toda a leveza que busco. “Não posso abandonar minhas responsabilidades. Não posso viver em uma ilha deserta para sempre. Não posso me tornar uma freira à vida familiar. Nem gostaria que isso acontecesse. A solução para mim não seria, com certeza, nem a renúncia total nem uma aceitação absoluta do mundo. Preciso encontrar um equilíbrio em algum lugar ou um ritmo que se alterne, como a oscilação do pêndulo entre estes dois pontos: solitude e comunhão, afastamento e retorno. Talvez eu possa aprender alguma coisa no meu período de afastamento e retorno. Talvez eu possa aprender alguma coisa nos meus períodos de afastamento que me seja útil quando eu voltar ao meu mundo. Para começar, posso pelo menos treinar durante essas duas semanas a simplicidade da vida exterior. Posso seguir essa pequena pista e ver aonde me leva.” (Lindberh).

2 comentários:

  1. Que coisa mais linda. Tanta sensibilidade e tanta identificação, rs.

    Fiquei muito emocionada. Cada vez mais percebo que somos irmãs de caminhada!

    Beijos

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  2. Sem dúvidas Dé! Vamos juntas por essas estradas da vida...

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